A resposta é simples: não. Não há alimentos “bons” e alimentos “maus”. Hoje é o Dia Mundial da Alimentação e, num mundo onde há centenas de milhões de pessoas a morrer à fome, quase pode parecer ridículo debater a “bondade” ou “maldade” do que comemos. Mas a verdade é que é preciso falar disso, mais do que nunca. Não só porque vejo pessoas cada vez mais confusas (e stressadas) sobre o que podem ou devem comer, mas também porque esta ideia de que há comida boa e má alimenta uma mentalidade restritiva e proibitiva em relação ao que pomos no prato, que facilmente degenera em comportamentos obsessivos e compulsivos com a comida.
Nunca houve tanta informação à solta sobre nutrição e alimentação saudável, nem propostas de dietas para todos os gostos e feitios. E, no entanto, apercebo-me diariamente de que as pessoas estão cada vez mais confusas sobre o que podem comer. Constato isso nos clientes que acompanho, nas pessoas que falam comigo, no meu círculo familiar e de amigos.
Há quem evite a fruta porque tem muito açúcar. Quem não coma hidratos ao jantar (ou de todo) porque engordam. Há quem só consuma produtos “light” ou “low-fat”. Quem demonize tudo o que tenha glúten e lactose. E claro que não estou aqui a falar de condições de saúde específicas, como a doença celíaca ou a intolerância à lactose, ou de quem segue uma determinada dieta por questões éticas ou morais, como a dieta vegetariana ou vegan.
Muito graças às redes sociais, há uma tendência crescente para alinhar em “modas e modinhas”, uma espécie de pressão social para mostrarmos que também somos “fit” e saudáveis. Mas, na realidade, a alimentação é algo muito pessoal. As panquecas de aveia e banana não são necessariamente melhores que pão com manteiga ou queijo ao pequeno-almoço. Podem ser melhores para mim, mas não para si.
É fácil não nos apercebemos que de que temos esta lista de alimentos bons e maus já bem interiorizada. Mas pergunte-se: quantas vezes já se massacrou por ter cedido à tentação e devorado aquele pastel de nata? Quantas vezes pensou “hoje portei-me bem” por se ter contentado só com sopa ao jantar? Quando comemos alimentos “bons”, achamos que somos saudáveis, que estamos a fazer o que devemos. Quando comemos alimentos “maus”, achamos que falhámos e – claro – que o problema é nosso, porque temos pouca força de vontade.
Sabe o que é isto? Stress alimentar. Nem sei se esta expressão existe, mas o stress em relação ao que comemos existe e anda por aí em força. E, tal como o stress do trabalho, dos nossos relacionamentos e da vida em geral, não nos faz nada bem. Perturba o nosso sistema digestivo, o nosso humor e estabilidade emocional e, consequentemente, compromete a nossa saúde.
Por isso, seja honesto consigo: também tem uma lista de alimentos bons e maus? Então vou dar-lhe seis razões para a pôr de lado e recuperar a liberdade na sua relação com a comida.
1 – Todos os alimentos são “combustível” para o nosso corpo
Hoje em dia, a mensagem de que há alimentos bons e maus está em todo o lado: em livros sobre nutrição, na televisão, nas dietas das celebridades e influencers, na internet e nas redes sociais ou até mesmo nas decisões políticas. É fácil dividirmos o mundo ao meio. De um lado, os alimentos saudáveis, ricos em nutrientes e minimamente processados, como os vegetais, a fruta, as leguminosas, a carne magra ou o peixe. Do outro lado, os produtos altamente processados, como o fast-food, ou os doces, o pão branco, as bolachas, etc.
Mas isso faz de uns os bons da fita e dos outros os maus? É óbvio que há diferenças entre estas duas categorias. Os alimentos geralmente apelidados de “maus”têm menor valor nutricional e, quando consumidos de forma regular e em excesso, estão associados a um maior risco de doenças. Mas isso não faz deles “maus” alimentos.
Todo e qualquer alimento fornece combustível e nutrição ao nosso corpo. E qualquer excesso alimentar, incluindo de um alimento bom, pode ser prejudicial ao corpo. Por exemplo, o excesso de água pode prejudicar o funcionamento dos rins e provocar hiponatremia (diluição da quantidade de sódio presente no corpo) e o consumo único ou em excesso de um só tipo de fibra pode gerar inflamação nos intestinos, diarreira ou mesmo obstipação.
O nosso corpo beneficia de uma dieta o mais variada possível, porque é assim que consegue ir buscar todos os nutrientes de que necessita. Quando consumimos alimentos diversos, e comemos com moderação, comer um alimento rico em açúcar ou em gordura não compromete a nossa saúde.
2 – Não é um alimento que define a forma como comemos ou quem somos
Conhece a história do jovem britânico que ficou cego depois de sete anos a comer apenas batatas fritas, pão branco, fatias de fiambre e salsichas? É claro que é assustador e faz-nos imediatamente pensar: então estes alimentos não são maus?
O problema não está especificamente nos alimentos que ele comia, mas nos que deixou de comer durante anos e que são essenciais para a saúde. A maioria das pessoas não come apenas batatas fritas, come uma variedade de alimentos. Por isso, o que se tem de preocupar é com algo chamado “equilíbrio”.
Se a maioria da sua alimentação (80 a 90%) é rica em nutrientes e minimamente processada, há certamente espaço para consumir alimentos menos nutritivos. Se a raiz é inversa (come sobretudo alimentos altamente processados e pouco nutritivos), há espaço para agir (veja aqui algumas dicas). Mas esqueça as listas de alimentos bons e maus, permitidos e proibidos.